Alesat atrai atenção de grupos internacionais

Quando fechou a venda da distribuidora de combustíveis Alesat para a concorrente Ipiranga, por 2,17 bilhões de reais, em junho de 2016, o empresário Marcelo Alecrim começou a fazer planos para uma vida nova. Imaginou que em seis meses tudo estaria aprovado e, depois de passar mais um ano como consultor no grupo, estaria livre para tirar um sabático, montar uma nova empresa ou escrever um livro com a história de sua vida. Os 14 meses que se seguiram, no entanto, foram de apreensão tanto para Alecrim quanto para seus mais de 1 200 funcionários. Nesse período, foi ficando latente uma postura mais dura do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que bloqueou uma fusão importante e poderia vetar também a venda da Alesat. Enquanto esperava pela decisão do Cade, a empresa viu seu negócio se deteriorar. A participação de mercado caiu de 4% para 2,9%. O faturamento recuou de 12,42 bilhões de reais, em 2016, para 11,19 bilhões, em 2017. Quando o Cade de fato vetou o negócio em agosto do ano passado, Alecrim e seus sócios, os fundos Darby e Asamar, deixaram de ganhar um dinheirão: cerca de 694 milhões, 396 milhões e 1,08 bilhão de reais, respectivamente. E viram-se forçados a correr atrás do tempo perdido. “Estávamos com o freio de mão puxado e de repente tivemos de acelerar para colocar o plano B em ação”, afirma Alecrim.

O plano B consistia em duas fases. Primeiro, era preciso melhorar imediatamente os resultados. A empresa renegociou contratos que estavam parados com fornecedores, montou uma importadora de combustíveis e fechou seus escritórios em Belo Horizonte e no Rio de Janeiro para concentrar as operações em São Paulo. Também aumentou o relacionamento com os donos de postos, que estavam inseguros sobre seu futuro. Em seis meses, segundo a empresa, a fatia perdida de mercado foi recuperada. Era a hora de começar a parte mais difícil do plano: implementar uma estratégia de crescimento de longo prazo. Sem o grupo Ultra, a Alesat voltou a ser o que era: uma nanica num mercado em que as três principais concorrentes têm cerca de 66% de participação. A BR Distribuidora domina o setor com 28%, a Ipiranga tem 20%, e a Raízen, 17%, segundo dados da Agência Nacional do Petróleo. Elas têm escala na compra de equipamentos para a construção de novos postos, na negociação de produtos vendidos nos postos (como lubrificantes) e principalmente nos custos de distribuição. Sozinha e com pouca capacidade de investimento, a Alesat poderia ver seus postos ser assediados pela concorrência. “Há um risco de a Alesat ficar isolada: sem fôlego para competir com as grandes e ao mesmo tempo distante das pequenas”, afirma Antonio Ticianeli, diretor da consultoria MTX, especializada em óleo e gás.

Para brigar com as grandes, a Alesat quer comprar as pequenas, já que não há outra grande companhia de porte similar no Brasil. Atualmente, 12% dos 42 000 postos do país são dominados por marcas pequenas. A maior participação da Alesat está nas regiões Sudeste e Nordeste, onde detém, respectivamente, 3,7% e 3,3% dos postos, principalmente longe das grandes cidades. Nas demais regiões, a participação é inferior a 2%. A estratégia adotada pela Alesat sempre foi crescer em cidades onde as grandes redes ficavam de fora. Seguindo a lógica, um mercado em potencial estaria na Região Centro-Oeste, onde as três grandes têm 38% do mercado (no Sudeste, alcançam 51%). Para marcar a nova estratégia, logo após a negativa do Cade, a Alesat se desfiliou do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes, entidade da qual fazia parte desde 2007 e que reúne as três maiores companhias de distribuição. Agora a Alesat integra a Associação das Distribuidoras de Combustíveis, que reúne as menores do setor. “O voto do Cade deixou claro que as maiores redes não podem mais comprar, mas nós podemos”, afirma Alecrim. Uma prioriade é converter os postos sem bandeira, que aproveitaram a crise econômica para avançar de 40% para 42,5% do mercado em três anos. Como não pagam royalties, eles conseguem vender mais barato, o que virou um enorme diferencial competitivo na crise. “Na medida em que a economia melhorar há uma expectativa de conversão de parte desses postos bandeira branca para marcas conhecidas. A Alesat está adotando uma postura agressiva nesse nicho”, diz um analista de um grande banco.

De aquisições a Alesat entende. O que começou com um posto de combustíveis do pai de Alecrim em Canguaretama, cidade de 25 000 habitantes no interior do Rio Grande do Norte, na década de 70, virou a Satélite Distribuidora de Petróleo em 1996. A Sat, como era conhecida, se fundiu em 2006 com a mineira Ale, que já era a quarta maior distribuidora do país, controlada pelo grupo mineiro Asamar. Para chegar até aqui, a empresa comprou algumas operações, como a Polipetro, que tinha atuação no Sul do país, e as operações da multinacional Repsol no Brasil, ambas em 2008, e a recifense Ello-Puma, em 2012. Hoje, é uma rede de 2 017 postos com um faturamento de 11,19 bilhões de reais. É pouco num mercado superlativo. A BR Distribuidora tem 7 617 postos e faturou 84,5 bilhões de reais em 2017. A meta da Alesat é acrescentar 200 novos postos à sua rede neste ano. O problema é que as principais concorrentes também estão com apetite para crescer. A BR Distribuidora, que abriu o capital no fim do ano passado, afirmou que pretende recuperar a participação de mercado perdida nos últimos anos. O grupo Ultra anunciou um investimento de 1,55 bilhão de reais na marca Ipiranga.

A decisão do Cade deixou claro que as outras duas grandes empresas brasileiras também não podem adquirir a Alesat, mas a companhia tem atraído a atenção de empresas estrangeiras. O grupo holandês de energia e commodities Vitol recentemente fez uma proposta de cerca de 1,8 bilhão de reais pela empresa e o grupo francês Total, quarta maior companhia de óleo e gás do mundo, que já negociou a compra da Alesat há cerca de dez anos, também voltou a sondá-la. Um sócio internacional poderia dar a estrutura necessária para a Alesat competir com as grandes. Outra opção é fazer uma oferta inicial de ações na bolsa brasileira, a B3, o que poderia acontecer ainda neste ano. “Eles de fato estudam um IPO. Mas, se pintar uma proposta boa, eles vendem”, diz um executivo a par do assunto.

O dilema vivido pela Alesat também atingiu outras companhias que tiveram suas operações negadas pelo Cade. Desde o ano passado foram reprovadas a união das empresas de educação Kroton e Estácio, a dos frigoríficos Mataboi e JBJ, a das distribuidoras de combustíveis Ipiranga e Alesat e a das empresas de gás Liquigás e Ultragaz. Para as consolidadoras, superar a negativa é sempre mais fácil. Para as menores, deixadas no altar, o desafio é sempre maior. Há incertezas tanto nas operações quanto ao que acontecerá com seu quadro societário. A Estácio empreendeu uma série de mudanças desde a rejeição do Cade, em junho, incluindo redução dos custos administrativos, mudanças na forma de atrair e reter alunos e alterações na maneira de cobrar mensalidades, que a tornaram mais parecida com a líder Kroton. A empresa também teve mudanças entre seus acionistas. A gestora americana Advent comprou ações da Estácio até acumular 11% do capital e ajudou a desenhar uma estratégia que fez o valor de mercado mais do que dobrar em nove meses. Ficar sozinho pode ser a chance de um recomeço animador. Sem centenas de milhões no bolso, é verdade.

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